A fruta
por Gabriel Rodrigues Garcia em 01/04/2016
Abri minha geladeira, olhei para dentro e com fome de gordo tirei para fora um pequeno pedaço gelado da fruta e dei uma dentada.
Mas como tudo é linguagem a fruta vermelha entrou mais nas lembranças do que no estômago e assim lembrei de um tempo, quando foi, 20, 30 anos atrás onde a minha maior felicidade era ir no armazém e trazer nas costas aquela bolota verde, era uma vitória.
Sim, pois aquela fruta pesava no orçamento de meu pai naquela época, e não bastava o desejo de sorver o suco, era preciso antes pedir para o meu pai, que normalmente, no verão sempre me agraciava com uma ou dua ao mês.
Eu que não era bobo, escolhia bem o dia, deixava o sol estar a pino, o calor insuportável e fazia o pedido, e quando com cara de pidão ganhava um sim, corria para o tenda do Edi, rindo e faceiro, e com um sorriso largo que já pronunciava na chegada ao quitandeiro qual seria a compra do dia.
E ele então, mandava que eu escolhesse, eta coisa difícil! Sim, pois aquela não era uma fruta qualquer, era rara, só aparecia no verão, e eu e minha amiga barriga esperávamos o ano inteiro pela sua companhia, assim ela não poderia ser escolhida assim ao léu, pois era uma escolha de uma vida.
Assim, iniciava o meu estudo da fruta, o qual nunca durava menos de uns 10, 15 minutos, uma ciência! Primeiro um passeio ao redor da exposição, analisava as qualidades os tamanhos, as cores, depois escolhidas as melhores, passava para um exame auditivo, e assim tamburicava fruta por fruta, na espreita do tom perfeito, por fim, escolhida aquela que iria iluminar meu dia, entregava-a na mão do quitandeiro, que com uma faca afiada, fazia a biópsia a fim de demonstrar pelo calado piramidal que a fruta era perfeita.
Como as coisas mudam, como a graça vai se perdendo, trocava todas as melancias fartas de hoje em dia por uma escassa da minha infância, mas onde estava a graça afinal ?
Mas me pergunto o que mudou ? Porque com o passar do tempo nossas alegrias singelas vão virando um chato abrir porta de geladeira, chego a me perguntar, se a fartura não estraga o gosto das coisas, vejo as crianças de hoje em dia que tem tudo e percebo que parece que elas não sente graça em nada. De fato os WIIs, IPADs, XBOXs, IPODs e PlayStations não colocam mais sorriso no rostos de uma crianças de hoje do que uma melancia colocava no meu.
O mais maluco de tudo isto é que pesquisas e números mostram que o mundo nunca teve tantos bens de consumo a disposição, mas ao mesmo tempo a humanidade nunca esteve tão infeliz, como agora.
É preciso repensar este consumo desfreado, pois a alegria e a felicidade não está em ter um monte de bugigangas, mas sim em ter tempo e espírito para curtir cada pequena fatia de uma melancia.
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Um feliz 2011 para todos!
Gabriel Rodrigues Garcia