Justiça Cega.... A questão do PIS COFINS sobre as faturas de telefone e energia

Nota do editor: Este é um artigo publicado no Espaço Vital pela advogada Marta Fehlauer (OAB-RS nº 64.166), que demonstra de uma forma excelente o absurdo da última decisão do STJ sobre a questão a incidência do PIS e COFINS sobre as contas de energia e telefone. Vale a pena a leitura.

Para a surpresa dos operadores do direito e invertendo o placar que estava a favor dos consumidores, o STJ decidiu por maioria dos votos, pela legalidade do repasse de PIS e Cofins nas contas de energia elétrica e telefonia.

Face o volume de ações ajuizadas por consumidores que buscavam ver reconhecida a ilegalidade do repasse destes tributos, o STJ colocou tais processos em pauta de julgamento como recursos repetitivos, o que significa dizer que a decisão tomada passa a ter aplicação nas demais instâncias da Justiça brasileira.

Sob a alegação de "manutenção do equilíbrio econômico financeiro", julgaram nossos ministros, em sua maioria a favor das companhias de energia elétrica e empresas de telefonia, autorizando o repasse dos tributos PIS e Cofins.

Mais uma vez se percebe neste país o desvirtuamento das leis e direitos dos cidadãos, em favor de interesses particulares.

A tese acerca da ilegalidade do repasse é cristalina e não deixa margem a interpretações diversas. O que é preciso se ter presente é que as concessionárias de serviço público estão vinculadas à lei e, assim, não podem alterar tarifas ou embutir tributos ao seu bel - prazer, ao sabor de suas urgentes pretensões de lucro. 

Este "equilíbrio econômico financeiro" a que se referem, consiste em uma manobra política para não levar à bancarrota as concessionárias de luz e telefonia; todavia, a cobrança continua sendo ilegal, mas para não ocorrer a quebra destas empresas. Mais uma vez quem paga a conta é o consumidor!

Essa conclusão é lógica face à confissão de concessionária de telefonia, a qual argumentou que caso tivesse de devolver os valores dos tributos arrecadados para os clientes, entre os anos de 2006 e 2009, teria de desembolsar R$ 2,1 bilhões. 

O montante, segundo esta empresa, seria desproporcional ao seu lucro no mesmo período, que totalizou R$ 1,3 bilhão. Referiu ainda, que além do prejuízo, o fim do repasse dos tributos tornaria a atividade antieconômica.

Ademais, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) se manifestou na ação, em favor das concessionárias e alertou para a possibilidade de aumento nas tarifas caso a interpretação do STJ fosse favorável aos consumidores, exigindo a devolução dos valores arrecadados com PIS e Cofins.

Já os consumidores argumentaram que o repasse não poderia ser mantido apenas para assegurar a margem de lucro das concessionárias, pois somente impostos cobrados sobre a operação de venda de bens e mercadorias e prestação de serviço - como o ICMS - poderiam ser repassados ao consumidor. 

De acordo com essa tese, o PIS e a Cofins não pode incidir diretamente na fatura, conta a conta, mas integrar proporcionalmente o custo da tarifa.

Os consumidores estavam vencendo a disputa por quatro votos a dois, até que o placar se inverteu. 

Também a ministra Eliana Calmon, em sua última participação na 1ª Turma do STJ, entendeu que a sistemática do repasse é permitida pela lei, e votou a favor das concessionárias. No entanto, a ministra ponderou que a vedação do repasse condenaria a empresa ao fracasso. 

Por seu turno, o ministro Humberto Martins, que havia votado favoravelmente aos consumidores, decidiu mudar seu voto, o que resultou em um placar de seis votos a três para as concessionárias.

Por analogia, esta decisão se estendeu ao repasse de PIS e Cofins nas tarifas de energia elétrica, pois caso fossem derrotadas, as distribuidoras de energia do país teriam que devolver cerca de R$ 27,5 bilhões aos consumidores. 

Portanto, resta claro no caso em apreço o que prevaleceu não foi a lei, mas tão somente o interesse econômico-financeiro na manutenção do lucro das empresas concessionárias de energia elétrica e telefonia. 

Nossos julgadores calaram-se quando deveriam falar; encolheram-se quando deveriam erguer-se; e cegaram-se quando precisariam enxergar. 

Assim, com muito pesar ante a batalha perdida em nome dos consumidores, deixo as palavras de José Saramago para nossos hermeneutas magistrados: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara."

 

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