Errou, data venia, o Supremo Tribunal Federal ao admitir, em decisão recente, a prisão de um acusado, logo após a condenação em segunda instância.

Errou, data venia, o Supremo Tribunal Federal ao admitir, em decisão recente, a prisão de um acusado, logo após a condenação em segunda instância. A votação esteve perto do empate (6 a 5).

Cedeu o Supremo à pressão de parte expressiva da opinião pública. Não se sabe se essa parte que apoia a linha dura é majoritária ou minoritária. Voraz certamente é porque está alimentada pelo ódio.

Se o braço vingador tem apoio maior ou menor é irrelevante. As questões éticas e os grandes critérios jurídicos não estão subordinados a percentuais de aprovação ou reprovação popular.

Examinemos o tema sob o ângulo doutrinário.

Não existe meia presunção de inocência, relativa presunção de inocência, presunção de inocência condicionada a isso ou aquilo. Presunção de inocência é presunção de inocência, não admite pano morno.

Diz o artigo 5o, inciso LVII, da Constituição Federal:

“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.”

A interpretação literal, textual ou gramatical do preceito exige o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para que alguém seja considerado culpado. A sentença transita em julgado quando já não mais se admite qualquer recurso.

O advérbio ninguém não tem sentido dúbio. Ninguém é ninguém. Todos os acusados estão amparados pela cláusula proibitória de admissão da culpa antes do trânsito em julgado de sentença desfavorável.

Estaremos rasgando a Constituição se admitimos que Luís, José, João, Isabel, Maria ou Dilma, qualquer pessoa seja considerada culpada antes de sentença final condenatória.

Hoje permite-se que José, Luís, Isabel ou Dilma seja considerada culpada antes do trânsito em julgado da sentença desfavorável. Amanhã não será José, Isabel ou Dilma, pessoas que não integram minha família, que sofrerá o ferrete da presunção de culpa, mas serei eu mesmo o alvo. Como cidadão brasileiro, não estarei protegido pelo preceito.

Além do dispositivo constitucional claríssimo, há todo um arcabouço doutrinário em apoio da presunção da inocência.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, em seu artigo XI, 1, dispõe: “Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

Em nosso Continente, a Convenção Americana dos Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) abrigou a garantia da presunção da inocência.

Desta forma, a presunção de inocência não é apenas um preceito do Direito brasileiro mas tem a chancela da cultura jurídica universal.

 

João Baptista Herkenhoff é magistrado aposentado (ES) e escritor. E-mail: jbpherkenhoff@gmail.com

Site: www.palestrantededireito.com.br

 

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